Cintura Verde da Ilha de Lovongai: Gestão Tradicional da Terra e do Mar Pelos 12 Clãs, Para os 12 Clãs, Papua Nova Guiné
Bolsa de 25 000 USD
para a criação de narrativas baseadas em indícios
que reforcem as práticas tradicionais de conservação,
comprovem a destruição provocada por indústrias extractivas,
preservem conhecimentos ancestrais
e apoiem processos de titulação de terras.
Nesta página, partilhamos informação sobre a comunidade servida por este projeto e os desafios específicos que enfrenta. Apresentamos o trabalho da Ailan Awareness, a organização indígena que nos orgulhamos de ter apoiado, e descrevemos pormenorizadamente o projeto que desenvolveram com este apoio
A COMUNIDADE
Papua-Nova Guiné
Nação insular do Pacífico, a Papua-Nova Guiné fica na Oceânia, e abrange a metade oriental da ilha da Nova Guiné. Mais de três quartos da população vive em zonas rurais e depende da natureza para a sua subsistência. Pescadores, agricultores e caçadores, os papuásios mantiveram, durante milhares de anos, práticas sociais e ecológicas que sustentaram as suas comunidades e preservaram as florestas e recifes da região.
A Papua-Nova Guiné é o país mais multilingue do mundo. Entre uma população pouco numerosa de 12 milhões de habitantes são faladas 830 línguas. Quase toda a população que vive atualmente na Papua-Nova Guiné é indígena. Os actuais habitantes do país podem traçar a sua ascendência a duas grandes migrações que povoaram a região. A primeira migração ocorreu há cerca de 50.000 anos, a segunda há cerca de 3.500 anos. Pode afirmar-se, por isso, que há uma ligação profunda entre as culturas da Papua Nova Guiné, a terra e o mar.
Província de Nova Irlanda
Nova Irlanda é um arquipélago no nordeste da Papua Nova Guiné, situado no centro do Triângulo de Coral, do qual fazem parte quatro grupos de ilhas e várias ilhas de grandes dimensões. Kavieng, a capital da Província, fica na Ilha de Nova Irlanda.
A gestão cuidadosa que os Povos Indígenas fizeram destas ilhas, ao longo de múltiplas gerações, contribuiu decisivamente para que se situem em Nova Irlanda alguns dos locais mais bem preservados e biologicamente diversos do mundo. Na Província de Nova Irlanda há dezoito grupos linguísticos distintos, que conferem uma enorme riqueza e prosperidade à cultura espiritual, expressiva e linguística da região.
Devido à falta de infra-estruturas e ao acesso limitado a bens e serviços, os habitantes de Nova Irlanda dependem quase inteiramente de recursos naturais locais para o seu sustento e rendimento. As suas vidas continuam, por isso, profundamente ligadas à floresta e aos recifes que existem ao redor das comunidades. No passado, os anciãos das comunidades de toda a Província conduziam a gestão dos recursos através de metodologias tradicionais, que refletem um profundo conhecimento local sobre como praticar a conservação do meio ambiente.
Ilha de Lovongai (Nova Hanover)
Ilha do nordeste, parte do arquipélago de Nova Irlanda, Lovongai é montanhosa e vulcânica, sendo grande parte da sua orla costeira fruto da elevação de solos oceânicos. Uma cadeia montanhosa conhecida como Tirpitz ou Lovongai Range atravessa toda a ilha. O Cabo de Mata-alem, península na zona oeste de Lovongai, pode ser caraterizado como um planalto calcário, baixo e pantanoso, originado a partir da emergência um solo oceânico. Já no interior da ilha, encontramos uma floresta densa, rodeada de saguis, mangais e extraordinários sistemas de recifes de coral.
Vários cursos de água curtos e velozes correm desde a cordilheira Tirpitz e das montanhas interiores, até desembocarem na costa sul da Ilha de Lovongai. Esta ligação entre os sistemas fluviais, os estuários e o oceano tem um enorme significado geográfico, cultural e espiritual para as populações que habitam a ilha, e cuja subsistência depende destes recursos naturais.
Socialmente, os habitantes de Lovongai estão agrupados em 12 clãs matrilineares. Os clãs são identificados segundo Pat-mani, o nome dado aos totens de aves da região. Em Lovongai, fala-se o tungag, o inglês e o tok pisin, entre outras línguas.
Indigenous knowledge for community benefit: examples from Lavongai (New Hanover) Island in the Pacific Region
OS DESAFIOS
Atualmente, toda a população da Papua Nova Guiné é indígena, e o país tem vivido uma situação de relativa estabilidade desde que a independência foi declarada em 1975. Os serviços nacionais de educação e de saúde são exclusivamente destinados aos papuásios, e não podem ser utilizados por indivíduos estrangeiros. Os direitos dos povos indígenas são cabalmente defendidos na Constituição da Papua Nova Guiné. Todas as terras são propriedade das comunidades indígenas, que podem arrendá-las a pessoas de fora, como é o caso de Lovongai. Além disso, o governo nacional é predominantemente composto por políticos indígenas. No entanto, é importante notar que a Papua Nova Guiné não subscreveu a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, e não conseguiu implementar plenamente os princípios enumerados na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP).
A segurança e o acesso a recursos básicos não têm sido garantidos na Papua Nova Guiné, onde o desenvolvimento de indústrias estrangeiras é priorizado em detrimento das comunidades locais. As consequências da colonização e da atividade das indústrias extractivas estrangeiras são profundas e duradouras. A Papua Nova Guiné tornou-se um hotspot internacional para a exploração de recursos minerais como o cobre e o ouro, e para as plantações de monoculturas como o côco e a palma. Estas são atualmente as principais indústrias de exportação do país, mas pouco, ou nenhum, do lucro chega ao governo local ou às populações locais.
Atualmente, na Nova Irlanda, a gestão indígena dos recursos locais e as práticas indígenas tradicionais estão a ser erradicadas, fruto de políticas nacionais que dão prioridade ao crescimento das indústrias extractivas. No entanto, as comunidades de toda a Província estão engajadas na luta pelos seus direitos, enquanto povos indígenas, e na obtenção de terras para que possam gerir os seus recursos marinhos e terrestres.
Em 2006, conflitos devido à utilização de recursos terrestres por parte de indústrias extrativistas, tais como a indústria madeireira, desencadearam uma guerra civil entre os clãs da ilha de Lovongai, desencadeando uma intervenção governamental limitada. Além disso, os recifes de coral que rodeiam a ilha encontram-se ameaçados por práticas destrutivas, tais como a pesca excessiva, pela industrialização e pelas alterações climáticas. Estes factores conduziram a uma degradação dos recifes e das populações de peixes da região, essenciais para as comunidades costeiras que deles dependem para obter alimentos e rendimentos. E se os recifes e espécies de peixes são profundamente afetados pelo crescimento populacional, pela procura internacional e pelo turismo, a verdade é que as práticas de alguns pescadores locais também contribuem para esta degradação. Este declínio é profundamente agravado pelo escoamento de sedimentos e pelas indústrias estrangeiras que operam na região. Projetos de conservação levaram à criação de zonas protegidas, mas a sua eficácia é questionada pela população local. A presença das autoridades e a aplicação da lei por parte do governo são demasiado limitadas para atenuar os desafios que estas comunidades enfrentam. Para resolver estes problemas, são necessárias práticas sustentáveis, uma governação eficaz e o envolvimento da comunidade.
A ORGANIZAÇÃO PARCEIRA
Ailan Awareness
Dirigida por John Aini, Mila Aini, Michael Ladi e habitantes da ilha de Lovongai, a Ailan Awareness é uma organização de base fundada em 1993 para apoiar e contribuir para os esforços de conservação ambiental na região. Atualmente, está ativamente envolvida no desenvolvimento de uma nova abordagem à conservação marinha, assente em princípios de sustentabilidade, e que rompe com os métodos de conservação tradicionais que excluem os conhecimentos indígenas. A Ailan Awareness propõe que todas as práticas de conservação se baseiem nos conhecimentos indígenas, capacitando as comunidades costeiras para gerirem os seus próprios recursos marinhos, e para protegerem as populações e os recifes.
Para além do seu trabalho na área da conservação, a Ailan Awareness também desempenhou um papel importante na promoção da paz e da reconciliação entre os 12 clãs da ilha, que estiveram recentemente envolvidos numa guerra civil. A Ailan Awareness conseguiu importantes avanços neste sentido, ao incentivar a cooperação e a harmonia entre os clãs, e ao promover a unidade e o orgulho cultural. O trabalho da organização é um modelo exemplar de como as organizações indígenas podem contribuir para a resolução de conflitos e para a preservação do património cultural.
Ao longo de várias décadas, o proeminente ativista ambiental John Aini tem procurado representar as comunidades da ilha de Nova Hanover. Aini organizou inúmeras campanhas de educação e sensibilização junto das comunidades costeiras da Província de Nova Irlanda, promovendo a gestão local e sustentável dos recursos. Paralelamente, tem estado envolvido na coordenação de trabalhos de investigação científica que estudam as unidades populacionais de peixes e a degradação dos ecossistemas marinhos da região.
O PROJETO
Cintura Verde da Ilha de Lovongai: Gestão Tradicional da Terra e do Mar Pelos 12 Clãs, Para os 12 Clãs, Papua Nova Guiné
Para o seu trabalho de promoção da cooperação e da paz entre os clãs de Lovongai, a Ailan Awareness tem organizado workshops de produção de filmes e de cartografia SIG (Sistemas de Informação Geográfica). A manutenção da paz e a preservação das práticas tradicionais estão intimamente ligadas à obtenção de títulos de terras tradicionais por parte das comunidades. No entanto, o acesso limitado a ferramentas tecnológicas dificulta a capacidade destas comunidades em documentar a sua ligação à terra. Este projeto visa fornecer os recursos e a formação necessários para capacitar os habitantes de Lovongai no uso destas ferramentas, e para facilitar a partilha de conhecimentos. Através desta documentação partilhada, as comunidades podem defender legalmente os seus direitos. Podem também exigir compensações pelas actividades de exploração madeireira, que foram realizadas sem consentimento prévio ao abrigo de contratos de arrendamento agrícola especial (SABL).
Com este projeto, a Ailan Awareness procurou:
- Capacitar mais de 17.000 membros da comunidade para documentar a degradação ambiental na região, proteger terras ancestrais e intentar acções judiciais.
- Capacitar dezasseis membros dos clãs nas áreas da produção audiovisual e da cartografia SIG, para que possam recolher provas de destruição ambiental, e subsequentemente usá-las junto dos tribunais, e de instituições governamentais e estatais, tendo em vista a proteção de territórios ancestrais.
- Identificar e tornar operativos os Espaços Ranguma, tradicionalmente utilizados pelos homens da comunidade para partilhar conhecimentos e tomar decisões sobre áreas de conservação, práticas sazonais, stocks de peixe e outras práticas importantes relacionadas com a biodiversidade e dos meios de subsistência. O projeto procurou reativar estes espaços enquanto elementos centrais na gestão ancestral da terra e do mar, e na partilha de conhecimentos.
Para atingir estes objectivos, a Ailan Awareness cartografou as fronteiras de três clãs, e identificou locais sagrados, num processo que envolveu extensas consultas comunitárias com os anciãos dos clãs, bem como o uso de novas tecnologias. O projeto resultou também na produção de três pequenos filmes, que documentam os conhecimentos tradicionais partilhados pelos anciãos dos clãs.
Da equipa principal do projeto, fizeram parte funcionários dedicados a tempo inteiro, desempenhando papéis essenciais nas áreas da educação, da gestão de recursos tradicionais, do estudo das zonas de pesca comunitárias, e da mobilização da população mais jovem. A equipa de implementação do projeto incluiu também cineastas e cartógrafos, com funções especializadas, tais como a engenharia de som ou a coordenação no registo de informação. Estas equipas, constituídas por membros muito experientes e outros recém-formados, foram capazes de usar os recursos tecnológicos do projeto para criar mapas e filmes de sensibilização, nunca perdendo de vista a importância das consultas comunitárias neste processo.
Para este projeto, a Ailan Awareness estabeleceu uma importante parceria com a People’s Planet Project. Uma parte central desta parceria foi a realização de um GeoStory Camp, durante o qual foi dada formação em cartografia geoespacial e em produção audiovisual. Esta parceria teve a duração de um ano, e incluiu a coordenação de grupos de trabalho, o apoio prestado por uma rede de especialistas e assistência técnica remota. Além disso, durante estes workshops, alguns dos participantes consolidaram o seu papel enquanto líderes comunitários, capazes de gerir as equipas. Este foi um aspecto que contribuiu para o fortalecimento da defesa dos clãs, através de uma combinação de sabedoria ancestral e do uso de novas tecnologias.
Outra das parcerias significativas da Ailan Awareness é com o Barnard College, da Universidade de Columbia, e muito particularmente com a Professora Paige West, que, juntamente com os seus alunos, contribui com competências de investigação e escrita para o trabalho da Ailan Awareness relacionado com o fortalecimento da soberania na área da conservação. Esta parceria está assente numa visão partilhada – de capacitação das comunidades indígenas, e de recuperação da soberania destas comunidades sobre o seu futuro socio-ecológico.
Reimagining conservation practice: Indigenous self-determination and collaboration in Papua New Guinea | Oryx | Cambridge Core
Cintura Verde da Ilha de Lovongai: Gestão Tradicional da Terra e do Mar Pelos 12 Clãs, Para os 12 Clãs, Papua Nova Guiné
Bolsa de 25 000 USD
para a criação de narrativas baseadas em indícios
que reforcem as práticas tradicionais de conservação,
comprovem a destruição provocada por indústrias extractivas,
preservem conhecimentos ancestrais
e apoiem processos de titulação de terras.
Nesta página, partilhamos informação sobre a comunidade servida por este projeto e os desafios específicos que enfrenta. Apresentamos o trabalho da Ailan Awareness, a organização indígena que nos orgulhamos de ter apoiado, e descrevemos pormenorizadamente o projeto que desenvolveram com este apoio
A COMUNIDADE
Papua-Nova Guiné
Nação insular do Pacífico, a Papua-Nova Guiné fica na Oceânia, e abrange a metade oriental da ilha da Nova Guiné. Mais de três quartos da população vive em zonas rurais e depende da natureza para a sua subsistência. Pescadores, agricultores e caçadores, os papuásios mantiveram, durante milhares de anos, práticas sociais e ecológicas que sustentaram as suas comunidades e preservaram as florestas e recifes da região.
A Papua-Nova Guiné é o país mais multilingue do mundo. Entre uma população pouco numerosa de 12 milhões de habitantes são faladas 830 línguas. Quase toda a população que vive atualmente na Papua-Nova Guiné é indígena. Os actuais habitantes do país podem traçar a sua ascendência a duas grandes migrações que povoaram a região. A primeira migração ocorreu há cerca de 50.000 anos, a segunda há cerca de 3.500 anos. Pode afirmar-se, por isso, que há uma ligação profunda entre as culturas da Papua Nova Guiné, a terra e o mar.
Província de Nova Irlanda
Nova Irlanda é um arquipélago no nordeste da Papua Nova Guiné, situado no centro do Triângulo de Coral, do qual fazem parte quatro grupos de ilhas e várias ilhas de grandes dimensões. Kavieng, a capital da Província, fica na Ilha de Nova Irlanda.
A gestão cuidadosa que os Povos Indígenas fizeram destas ilhas, ao longo de múltiplas gerações, contribuiu decisivamente para que se situem em Nova Irlanda alguns dos locais mais bem preservados e biologicamente diversos do mundo. Na Província de Nova Irlanda há dezoito grupos linguísticos distintos, que conferem uma enorme riqueza e prosperidade à cultura espiritual, expressiva e linguística da região.
Devido à falta de infra-estruturas e ao acesso limitado a bens e serviços, os habitantes de Nova Irlanda dependem quase inteiramente de recursos naturais locais para o seu sustento e rendimento. As suas vidas continuam, por isso, profundamente ligadas à floresta e aos recifes que existem ao redor das comunidades. No passado, os anciãos das comunidades de toda a Província conduziam a gestão dos recursos através de metodologias tradicionais, que refletem um profundo conhecimento local sobre como praticar a conservação do meio ambiente.
Ilha de Lovongai (Nova Hanover)
Ilha do nordeste, parte do arquipélago de Nova Irlanda, Lovongai é montanhosa e vulcânica, sendo grande parte da sua orla costeira fruto da elevação de solos oceânicos. Uma cadeia montanhosa conhecida como Tirpitz ou Lovongai Range atravessa toda a ilha. O Cabo de Mata-alem, península na zona oeste de Lovongai, pode ser caraterizado como um planalto calcário, baixo e pantanoso, originado a partir da emergência um solo oceânico. Já no interior da ilha, encontramos uma floresta densa, rodeada de saguis, mangais e extraordinários sistemas de recifes de coral.
Vários cursos de água curtos e velozes correm desde a cordilheira Tirpitz e das montanhas interiores, até desembocarem na costa sul da Ilha de Lovongai. Esta ligação entre os sistemas fluviais, os estuários e o oceano tem um enorme significado geográfico, cultural e espiritual para as populações que habitam a ilha, e cuja subsistência depende destes recursos naturais.
Socialmente, os habitantes de Lovongai estão agrupados em 12 clãs matrilineares. Os clãs são identificados segundo Pat-mani, o nome dado aos totens de aves da região. Em Lovongai, fala-se o tungag, o inglês e o tok pisin, entre outras línguas.
Indigenous knowledge for community benefit: examples from Lavongai (New Hanover) Island in the Pacific Region
OS DESAFIOS
Atualmente, toda a população da Papua Nova Guiné é indígena, e o país tem vivido uma situação de relativa estabilidade desde que a independência foi declarada em 1975. Os serviços nacionais de educação e de saúde são exclusivamente destinados aos papuásios, e não podem ser utilizados por indivíduos estrangeiros. Os direitos dos povos indígenas são cabalmente defendidos na Constituição da Papua Nova Guiné. Todas as terras são propriedade das comunidades indígenas, que podem arrendá-las a pessoas de fora, como é o caso de Lovongai. Além disso, o governo nacional é predominantemente composto por políticos indígenas. No entanto, é importante notar que a Papua Nova Guiné não subscreveu a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, e não conseguiu implementar plenamente os princípios enumerados na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP).
A segurança e o acesso a recursos básicos não têm sido garantidos na Papua Nova Guiné, onde o desenvolvimento de indústrias estrangeiras é priorizado em detrimento das comunidades locais. As consequências da colonização e da atividade das indústrias extractivas estrangeiras são profundas e duradouras. A Papua Nova Guiné tornou-se um hotspot internacional para a exploração de recursos minerais como o cobre e o ouro, e para as plantações de monoculturas como o côco e a palma. Estas são atualmente as principais indústrias de exportação do país, mas pouco, ou nenhum, do lucro chega ao governo local ou às populações locais.
Atualmente, na Nova Irlanda, a gestão indígena dos recursos locais e as práticas indígenas tradicionais estão a ser erradicadas, fruto de políticas nacionais que dão prioridade ao crescimento das indústrias extractivas. No entanto, as comunidades de toda a Província estão engajadas na luta pelos seus direitos, enquanto povos indígenas, e na obtenção de terras para que possam gerir os seus recursos marinhos e terrestres.
Em 2006, conflitos devido à utilização de recursos terrestres por parte de indústrias extrativistas, tais como a indústria madeireira, desencadearam uma guerra civil entre os clãs da ilha de Lovongai, desencadeando uma intervenção governamental limitada. Além disso, os recifes de coral que rodeiam a ilha encontram-se ameaçados por práticas destrutivas, tais como a pesca excessiva, pela industrialização e pelas alterações climáticas. Estes factores conduziram a uma degradação dos recifes e das populações de peixes da região, essenciais para as comunidades costeiras que deles dependem para obter alimentos e rendimentos. E se os recifes e espécies de peixes são profundamente afetados pelo crescimento populacional, pela procura internacional e pelo turismo, a verdade é que as práticas de alguns pescadores locais também contribuem para esta degradação. Este declínio é profundamente agravado pelo escoamento de sedimentos e pelas indústrias estrangeiras que operam na região. Projetos de conservação levaram à criação de zonas protegidas, mas a sua eficácia é questionada pela população local. A presença das autoridades e a aplicação da lei por parte do governo são demasiado limitadas para atenuar os desafios que estas comunidades enfrentam. Para resolver estes problemas, são necessárias práticas sustentáveis, uma governação eficaz e o envolvimento da comunidade.
A ORGANIZAÇÃO PARCEIRA
Ailan Awareness
Dirigida por John Aini, Mila Aini, Michael Ladi e habitantes da ilha de Lovongai, a Ailan Awareness é uma organização de base fundada em 1993 para apoiar e contribuir para os esforços de conservação ambiental na região. Atualmente, está ativamente envolvida no desenvolvimento de uma nova abordagem à conservação marinha, assente em princípios de sustentabilidade, e que rompe com os métodos de conservação tradicionais que excluem os conhecimentos indígenas. A Ailan Awareness propõe que todas as práticas de conservação se baseiem nos conhecimentos indígenas, capacitando as comunidades costeiras para gerirem os seus próprios recursos marinhos, e para protegerem as populações e os recifes.
Para além do seu trabalho na área da conservação, a Ailan Awareness também desempenhou um papel importante na promoção da paz e da reconciliação entre os 12 clãs da ilha, que estiveram recentemente envolvidos numa guerra civil. A Ailan Awareness conseguiu importantes avanços neste sentido, ao incentivar a cooperação e a harmonia entre os clãs, e ao promover a unidade e o orgulho cultural. O trabalho da organização é um modelo exemplar de como as organizações indígenas podem contribuir para a resolução de conflitos e para a preservação do património cultural.
Ao longo de várias décadas, o proeminente ativista ambiental John Aini tem procurado representar as comunidades da ilha de Nova Hanover. Aini organizou inúmeras campanhas de educação e sensibilização junto das comunidades costeiras da Província de Nova Irlanda, promovendo a gestão local e sustentável dos recursos. Paralelamente, tem estado envolvido na coordenação de trabalhos de investigação científica que estudam as unidades populacionais de peixes e a degradação dos ecossistemas marinhos da região.
O PROJETO
Cintura Verde da Ilha de Lovongai: Gestão Tradicional da Terra e do Mar Pelos 12 Clãs, Para os 12 Clãs, Papua Nova Guiné
Para o seu trabalho de promoção da cooperação e da paz entre os clãs de Lovongai, a Ailan Awareness tem organizado workshops de produção de filmes e de cartografia SIG (Sistemas de Informação Geográfica). A manutenção da paz e a preservação das práticas tradicionais estão intimamente ligadas à obtenção de títulos de terras tradicionais por parte das comunidades. No entanto, o acesso limitado a ferramentas tecnológicas dificulta a capacidade destas comunidades em documentar a sua ligação à terra. Este projeto visa fornecer os recursos e a formação necessários para capacitar os habitantes de Lovongai no uso destas ferramentas, e para facilitar a partilha de conhecimentos. Através desta documentação partilhada, as comunidades podem defender legalmente os seus direitos. Podem também exigir compensações pelas actividades de exploração madeireira, que foram realizadas sem consentimento prévio ao abrigo de contratos de arrendamento agrícola especial (SABL).
Com este projeto, a Ailan Awareness procurou:
- Capacitar mais de 17.000 membros da comunidade para documentar a degradação ambiental na região, proteger terras ancestrais e intentar acções judiciais.
- Capacitar dezasseis membros dos clãs nas áreas da produção audiovisual e da cartografia SIG, para que possam recolher provas de destruição ambiental, e subsequentemente usá-las junto dos tribunais, e de instituições governamentais e estatais, tendo em vista a proteção de territórios ancestrais.
- Identificar e tornar operativos os Espaços Ranguma, tradicionalmente utilizados pelos homens da comunidade para partilhar conhecimentos e tomar decisões sobre áreas de conservação, práticas sazonais, stocks de peixe e outras práticas importantes relacionadas com a biodiversidade e dos meios de subsistência. O projeto procurou reativar estes espaços enquanto elementos centrais na gestão ancestral da terra e do mar, e na partilha de conhecimentos.
Para atingir estes objectivos, a Ailan Awareness cartografou as fronteiras de três clãs, e identificou locais sagrados, num processo que envolveu extensas consultas comunitárias com os anciãos dos clãs, bem como o uso de novas tecnologias. O projeto resultou também na produção de três pequenos filmes, que documentam os conhecimentos tradicionais partilhados pelos anciãos dos clãs.
Da equipa principal do projeto, fizeram parte funcionários dedicados a tempo inteiro, desempenhando papéis essenciais nas áreas da educação, da gestão de recursos tradicionais, do estudo das zonas de pesca comunitárias, e da mobilização da população mais jovem. A equipa de implementação do projeto incluiu também cineastas e cartógrafos, com funções especializadas, tais como a engenharia de som ou a coordenação no registo de informação. Estas equipas, constituídas por membros muito experientes e outros recém-formados, foram capazes de usar os recursos tecnológicos do projeto para criar mapas e filmes de sensibilização, nunca perdendo de vista a importância das consultas comunitárias neste processo.
Para este projeto, a Ailan Awareness estabeleceu uma importante parceria com a People’s Planet Project. Uma parte central desta parceria foi a realização de um GeoStory Camp, durante o qual foi dada formação em cartografia geoespacial e em produção audiovisual. Esta parceria teve a duração de um ano, e incluiu a coordenação de grupos de trabalho, o apoio prestado por uma rede de especialistas e assistência técnica remota. Além disso, durante estes workshops, alguns dos participantes consolidaram o seu papel enquanto líderes comunitários, capazes de gerir as equipas. Este foi um aspecto que contribuiu para o fortalecimento da defesa dos clãs, através de uma combinação de sabedoria ancestral e do uso de novas tecnologias.
Outra das parcerias significativas da Ailan Awareness é com o Barnard College, da Universidade de Columbia, e muito particularmente com a Professora Paige West, que, juntamente com os seus alunos, contribui com competências de investigação e escrita para o trabalho da Ailan Awareness relacionado com o fortalecimento da soberania na área da conservação. Esta parceria está assente numa visão partilhada – de capacitação das comunidades indígenas, e de recuperação da soberania destas comunidades sobre o seu futuro socio-ecológico.