Proteger as Águas do Pantanal: Iniciativa Indígena de Segurança Hídrica e Mapeamento do Meio Ambiente, Mato Grosso do Sul, Brasil

Atenuar a escassez de água
através de um processo integrado
que inclui 
a cartografia hidrográfica,
sistemas de captação de água da chuva
e reflorestação com espécies autóctones.

O Que Vai Encontrar Nesta Página

Nesta página, partilhamos informação sobre o povo Terena e os desafios ambientais que enfrenta na região do Pantanal. Apresentamos o trabalho do Coletivo Inamatí Xâné Terenoe, a organização indígena juvenil que nos orgulhamos de ter apoiado, e descrevemos pormenorizadamente o seu projeto de acesso à água e de recuperação ambiental. Convidamo-lo a explorar este projeto, a tornar-se um aliado e a descobrir formas de apoiar diretamente o trabalho do Coletivo.

A COMUNIDADE

Os Terena, povo que se autodenomina enquanto Xané, são os últimos descendentes vivos da nação Guaná no Brasil. Falam uma língua da família Arawak. O seu território ancestral fica no Pantanal, a maior zona húmida do mundo. Antes da chegada dos europeus no século XVI, já o povo Terena desenvolvia sistemas agrícolas e sociais muito sofisticados na região. Ao longo da sua história, encontramos exemplos de uma notável resiliência, mas também de adaptação estratégica, face às circunstâncias variáveis que caracterizam séculos de pressão colonial.

Hoje, os Terena vivem maioritariamente num território descontínuo, fragmentado em pequenas “ilhas” cercadas por fazendas, e que atravessa seis municípios do Mato Grosso do Sul. Há também comunidades Terena que vivem no Mato Grosso e em São Paulo, como resultado de migrações forçadas. No estado de Mato Grosso do Sul vive a segunda maior população indígena do Brasil, apenas superada pela do Amazonas, estando os Terena entre os povos indígenas mais numerosos da região.

330512765_864190568011531_1381172262403848288_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A aldeia Bananal, onde o projeto está a ser implementado, é uma das 15 aldeias da Terra Indígena Taunay Ipegue. O território tradicional dos Terena já abarcou uma área superior a 30.000 hectares, mas passa hoje pelo processo de demarcação definitiva, que se tem tornado cada vez mais complexo nos últimos anos. A aldeia Bananal é um dos povoados mais antigos da região, e funciona, por isso, como ponto central da comunidade. Com uma população de cerca de 1.000 indivíduos, é no Bananal que se podem encontrar infraestruturas como escolas, serviços básicos de saúde e um centro comunitário.

332453261_945554196474744_7123750889927976171_n

Bananal village. Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

Historicamente, os Terena têm-se destacado pelos seus conhecimentos agrícolas e experiência diplomática. A sua sobrevivência, a capacidade de se adaptarem constantemente a circunstâncias difíceis e imprevisíveis, não teria sido possível sem um vasto conhecimento tradicional de agrofloresta e de gestão ambiental. Os líderes Terena têm desempenhado um papel crucial na luta pelos direitos indígenas, e contribuíram para a formulação da Constituição Brasileira e da Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas das Nações Unidas. Estas conquistas diplomáticas reflectem uma longa história de construção estratégica de alianças, que remonta às relações históricas dos Terena com as potências coloniais, e também com outras nações indígenas.

Tal não impede, no entanto, que esta região enfrente hoje grandes desafios. Segundo uma investigação da Global Witness, o Mato Grosso do Sul está entre os lugares mais perigosos do mundo para líderes indígenas e activistas ambientais. Os territórios do povo Terena sofrem enormes pressões devido à expansão do agronegócio, que desencadeou conflitos em torno do uso das terras e que tem levado à contaminação dos recursos naturais. Estudos recentes confirmam que esta região se tornou um ponto focal da tensão entre direitos indígenas e expansão agrícola, com implicações significativas para a salvaguarda dos direitos humanos e da proteção ambiental no Brasil, e no mundo.

EXTERNAL LINK

OS DESAFIOS

Os Terena enfrentam uma série de desafios complexos e interligados, que ameaçam tanto o seu modo de vida tradicional como a sustentabilidade ambiental na região. Uma profunda e perversa ironia ocupa um lugar central nesta conjugação de desafios: um povo cujo território ancestral é considerado a maior zona húmida do mundo enfrenta hoje uma escassez de água sem precedentes.

Esta situação tornou-se particularmente grave nos últimos anos. Apesar da riqueza em recursos hídricos que caracteriza o seu território tradicional, os Terena enfrentam actualmente condições de seca severas que alteraram fundamentalmente as suas práticas agrícolas e o seu quotidiano. Esta crise é agravada pela contínua expansão do agronegócio na região, que impacta direta e indiretamente a disponibilidade e qualidade da água.

No centro desta crise está também a desflorestação, que danifica de forma muito profunda estes ecossistemas e territórios. A desflorestação não só destrói recursos florestais insubstituíveis, como provoca alterações de fundo nos ciclos hidrológicos e na estabilidade dos solos. A perda de vegetação nativa acelerou a erosão dos solos e reduziu as suas capacidades naturais de retenção de água, gerando um ciclo vicioso de degradação ambiental.

EXTERNAL LINK

A qualidade da água também passou a ser um dos principais problemas. A presença de operações agrícolas de grande escala junto a fontes de água torna recorrente a possibilidade de contaminação das mesmas por agroquímicos. As fontes de água potável passam a ser possíveis focos de insegurança. Tanto a viabilidade das práticas agrícolas tradicionais, como a estabilidade dos ecossistemas locais, são postas em causa.

Os impactos das alterações climáticas são cada vez mais evidentes na região. Os Terena lidam hoje com secas mais frequentes e severas, que afectam os ciclos agrícolas tradicionais e obrigam as comunidades a alterar práticas agrícolas há muito estabelecidas. Estas adaptações às alterações climáticas põem em causa a capacidade dos Terena de manterem a variedade das culturas tradicionais e de continuarem a praticar técnicas agrícolas que foram transmitidas ao longo de gerações.

EXTERNAL LINK

O direito à terra também continua a ser um dos grandes desafios que os Terena enfrentam. Obrigados a focar recursos na demarcação do território, ficam significativamente limitados na sua capacidade de implementar estratégias abrangentes de gestão da água. A cobertura mediática dos últimos anos mostra claramente que o clima político em torno da questão dos direitos territoriais indígenas no Brasil se tem tornado cada vez mais complexo, com o surgimento de novos desafios legislativos que ameaçam as proteções existentes. Esta incerteza afeta a actual gestão dos recursos hídricos por parte dos Terena, e também a sua capacidade de abordar a longo prazo as questões de sustentabilidade ambiental.

Todos estes desafios são exacerbados pelo contexto mais amplo, caracterizado por pressões políticas e sociais. Desenvolvimentos legislativos recentes, tensões políticas – há cada vez mais obstáculos para as comunidades indígenas que procuram proteger os seus recursos naturais. Em novembro de 2024, o coordenador executivo da APIB, Alberto Terena, disse à Agência Brasil que uma legislação como a PEC 48 “É uma ameaça contra as nossas terras demarcadas e as já demarcadas porque eles vão querer rever as já demarcadas com o marco temporal. A luta indígena envolve toda a sociedade brasileira por agravar a crise climática.”

EXTERNAL LINK

A ORGANIZAÇÃO PARCEIRA

O Coletivo Inamatí Xâné Terenoe surgiu em 2021, durante a pandemia de COVID-19. A formação da organização foi uma resposta à necessidade urgente de mais ações de preservação ambiental e cultural na comunidade Terena, especialmente ao nível de ações lideradas por jovens. Na origem do Coletivo está um grupo de jovens educadores, comunicadores e investigadores Terena, da Aldeia Bananal. A organização representa o compromisso de uma nova geração apostada em enfrentar desafios contemporâneos, ao mesmo tempo que honra os conhecimentos e práticas tradicionais.

A essência do Coletivo é ser uma ponte entre gerações, que une a sabedoria dos membros mais velhos da comunidade à energia e à capacidade de inovação dos mais jovens. O trabalho da organização toca em múltiplas dimensões da vida da comunidade, incluindo a proteção ambiental, a monitorização do território, a preservação cultural e a gestão sustentável dos recursos. Esta abordagem está profundamente enraizada nos valores tradicionais dos Terena, mas adopta também ferramentas e métodos contemporâneos, capazes de responder aos desafios do presente.

301635377_112493644915429_2702303741171607581_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A eficácia deste trabalho e desta abordagem têm sido evidentes desde as primeiras iniciativas comunitárias levadas a cabo pelo Coletivo. É de destacar o desenho e implementação de projectos ambientais, tais como a recuperação de lagos comunitários e a proteção de fontes de água. Mas o trabalho da organização vai muito além deste âmbito, abrangendo também áreas como a documentação e a comunicação, através das quais assegura a preservação do conhecimento tradicional e o registo detalhado das actuais condições ambientais, para uso das gerações futuras.

334295632_6040036742685530_3406140533662151257_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

O Coletivo responde às orientações dos líderes comunitários, assegurando que as actividades implementadas respeitam as estruturas de governação tradicionais. Ao mesmo tempo, o Coletivo está fortemente apostado na capacitação de jovens lideranças na comunidade. Esta abordagem permite construir uma relação de confiança genuína com a comunidade, e introduzir, simultaneamente, soluções inovadoras para os desafios ambientais urgentes que afectam os Terena.

314707617_135515779287872_3916886336189579725_n

Credit: Coletivo Inamatí Xâné Terenoe

O PROJECTO

A promoção da segurança hídrica está no centro deste projecto, que pretende, através de uma abordagem holística, enfrentar os desafios sentidos pela comunidade no acesso à água. Para tal, combina o recurso ao conhecimento tradicional Terena com práticas contemporâneas de gestão ambiental. No seu cerne está a filosofia dos anciãos Terena, que dizem ser possível “plantar água” – uma expressão que denota a profunda interligação entre saúde da floresta e segurança hídrica.

O projeto parte de um mapeamento hidrográfico abrangente do território. Abrangente, porque não só envolve levantamentos técnicos, como também uma documentação do conhecimento tradicional sobre as fontes de água e as suas alterações históricas. A equipa do projecto responsável pela cartografia está a trabalhar de forma muito próxima com os anciãos da comunidade, para que fiquem registados, a par dos dados físicos, os conhecimentos tradicionais sobre as fontes de água. Desta forma, o projecto está a criar um repositório único, que cruza e une conhecimento científico e tradicional.

325951532_1494513357746045_5927502803448459902_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A componente do projecto ligada à recolha de águas pluviais tem como objetivo proporcionar um alívio imediato das necessidades da comunidade. Mas, ao mesmo tempo, almeja uma resiliência a longo prazo. Os sistemas de recolha que estão a ser construídos respeitam a arquitetura tradicional, mas incorporam técnicas contemporâneas que melhoram significativamente a sua taxa de eficiência. Os membros da comunidade estão a receber formação para serem capazes de fazer a manutenção do sistema, permitindo autonomia na gestão da água recolhida, e assegurando a sustentabilidade das instalações.

Mas a filosofia Terena que afirma ser possível “plantar água” está especialmente presente na componente do projecto focada no reflorestamento através da plantação de espécies nativas. Para este trabalho, anciãos da comunidade colaboram com especialistas em botânica, tendo em vista a construção de um viveiro rico em espécies conhecidas pelas suas propriedades de retenção de água e pelo seu significado cultural. Esta iniciativa procura não só recuperar áreas degradadas, como também reforçar a ligação da comunidade aos seus conhecimentos tradicionais sobre o meio ambiente.

Todas as componentes do projeto enfatizam a participação da comunidade e a transferência inter-geracional de conhecimentos. A formação e a documentação estão presentes em todas as actividades, de forma a garantir que os conhecimentos e competências desenvolvidos continuarão a beneficiar a comunidade muito depois do período inicial do projeto.

334578576_569417101801778_3903016549135222750_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A Azimuth World Foundation orgulha-se de ter apoiado este projecto do Coletivo Inamatí Xâné Terenoe. Convidamo-lo a saber mais sobre o trabalho vital da organização na proteção dos recursos hídricos e do património ambiental do Pantanal. Pode entrar em contato com o Coletivo através da página oficial no Facebook, caso queria saber como pode apoiar directamente as suas iniciativas:

A Azimuth World Foundation não faz angariação de fundos para si mesma, nem para os seus parceiros, e não recebe doações. O link partilhado acima reencaminha diretamente para o perfil oficial do Coletivo Inamatí Xâné Terenoe no Facebook.

Share

Proteger as Águas do Pantanal: Iniciativa Indígena de Segurança Hídrica e Mapeamento do Meio Ambiente, Mato Grosso do Sul, Brasil

Atenuar a escassez de água
através de um processo integrado
que inclui 
a cartografia hidrográfica,
sistemas de captação de água da chuva
e reflorestação com espécies autóctones.

O Que Vai Encontrar Nesta Página

Nesta página, partilhamos informação sobre o povo Terena e os desafios ambientais que enfrenta na região do Pantanal. Apresentamos o trabalho do Coletivo Inamatí Xâné Terenoe, a organização indígena juvenil que nos orgulhamos de ter apoiado, e descrevemos pormenorizadamente o seu projeto de acesso à água e de recuperação ambiental. Convidamo-lo a explorar este projeto, a tornar-se um aliado e a descobrir formas de apoiar diretamente o trabalho do Coletivo.

A COMUNIDADE

Os Terena, povo que se autodenomina enquanto Xané, são os últimos descendentes vivos da nação Guaná no Brasil. Falam uma língua da família Arawak. O seu território ancestral fica no Pantanal, a maior zona húmida do mundo. Antes da chegada dos europeus no século XVI, já o povo Terena desenvolvia sistemas agrícolas e sociais muito sofisticados na região. Ao longo da sua história, encontramos exemplos de uma notável resiliência, mas também de adaptação estratégica, face às circunstâncias variáveis que caracterizam séculos de pressão colonial.

Hoje, os Terena vivem maioritariamente num território descontínuo, fragmentado em pequenas “ilhas” cercadas por fazendas, e que atravessa seis municípios do Mato Grosso do Sul. Há também comunidades Terena que vivem no Mato Grosso e em São Paulo, como resultado de migrações forçadas. No estado de Mato Grosso do Sul vive a segunda maior população indígena do Brasil, apenas superada pela do Amazonas, estando os Terena entre os povos indígenas mais numerosos da região.

330512765_864190568011531_1381172262403848288_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A aldeia Bananal, onde o projeto está a ser implementado, é uma das 15 aldeias da Terra Indígena Taunay Ipegue. O território tradicional dos Terena já abarcou uma área superior a 30.000 hectares, mas passa hoje pelo processo de demarcação definitiva, que se tem tornado cada vez mais complexo nos últimos anos. A aldeia Bananal é um dos povoados mais antigos da região, e funciona, por isso, como ponto central da comunidade. Com uma população de cerca de 1.000 indivíduos, é no Bananal que se podem encontrar infraestruturas como escolas, serviços básicos de saúde e um centro comunitário.

332453261_945554196474744_7123750889927976171_n

Bananal village. Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

Historicamente, os Terena têm-se destacado pelos seus conhecimentos agrícolas e experiência diplomática. A sua sobrevivência, a capacidade de se adaptarem constantemente a circunstâncias difíceis e imprevisíveis, não teria sido possível sem um vasto conhecimento tradicional de agrofloresta e de gestão ambiental. Os líderes Terena têm desempenhado um papel crucial na luta pelos direitos indígenas, e contribuíram para a formulação da Constituição Brasileira e da Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas das Nações Unidas. Estas conquistas diplomáticas reflectem uma longa história de construção estratégica de alianças, que remonta às relações históricas dos Terena com as potências coloniais, e também com outras nações indígenas.

Tal não impede, no entanto, que esta região enfrente hoje grandes desafios. Segundo uma investigação da Global Witness, o Mato Grosso do Sul está entre os lugares mais perigosos do mundo para líderes indígenas e activistas ambientais. Os territórios do povo Terena sofrem enormes pressões devido à expansão do agronegócio, que desencadeou conflitos em torno do uso das terras e que tem levado à contaminação dos recursos naturais. Estudos recentes confirmam que esta região se tornou um ponto focal da tensão entre direitos indígenas e expansão agrícola, com implicações significativas para a salvaguarda dos direitos humanos e da proteção ambiental no Brasil, e no mundo.

EXTERNAL LINK

OS DESAFIOS

Os Terena enfrentam uma série de desafios complexos e interligados, que ameaçam tanto o seu modo de vida tradicional como a sustentabilidade ambiental na região. Uma profunda e perversa ironia ocupa um lugar central nesta conjugação de desafios: um povo cujo território ancestral é considerado a maior zona húmida do mundo enfrenta hoje uma escassez de água sem precedentes.

Esta situação tornou-se particularmente grave nos últimos anos. Apesar da riqueza em recursos hídricos que caracteriza o seu território tradicional, os Terena enfrentam actualmente condições de seca severas que alteraram fundamentalmente as suas práticas agrícolas e o seu quotidiano. Esta crise é agravada pela contínua expansão do agronegócio na região, que impacta direta e indiretamente a disponibilidade e qualidade da água.

No centro desta crise está também a desflorestação, que danifica de forma muito profunda estes ecossistemas e territórios. A desflorestação não só destrói recursos florestais insubstituíveis, como provoca alterações de fundo nos ciclos hidrológicos e na estabilidade dos solos. A perda de vegetação nativa acelerou a erosão dos solos e reduziu as suas capacidades naturais de retenção de água, gerando um ciclo vicioso de degradação ambiental.

EXTERNAL LINK

A qualidade da água também passou a ser um dos principais problemas. A presença de operações agrícolas de grande escala junto a fontes de água torna recorrente a possibilidade de contaminação das mesmas por agroquímicos. As fontes de água potável passam a ser possíveis focos de insegurança. Tanto a viabilidade das práticas agrícolas tradicionais, como a estabilidade dos ecossistemas locais, são postas em causa.

Os impactos das alterações climáticas são cada vez mais evidentes na região. Os Terena lidam hoje com secas mais frequentes e severas, que afectam os ciclos agrícolas tradicionais e obrigam as comunidades a alterar práticas agrícolas há muito estabelecidas. Estas adaptações às alterações climáticas põem em causa a capacidade dos Terena de manterem a variedade das culturas tradicionais e de continuarem a praticar técnicas agrícolas que foram transmitidas ao longo de gerações.

EXTERNAL LINK

O direito à terra também continua a ser um dos grandes desafios que os Terena enfrentam. Obrigados a focar recursos na demarcação do território, ficam significativamente limitados na sua capacidade de implementar estratégias abrangentes de gestão da água. A cobertura mediática dos últimos anos mostra claramente que o clima político em torno da questão dos direitos territoriais indígenas no Brasil se tem tornado cada vez mais complexo, com o surgimento de novos desafios legislativos que ameaçam as proteções existentes. Esta incerteza afeta a actual gestão dos recursos hídricos por parte dos Terena, e também a sua capacidade de abordar a longo prazo as questões de sustentabilidade ambiental.

Todos estes desafios são exacerbados pelo contexto mais amplo, caracterizado por pressões políticas e sociais. Desenvolvimentos legislativos recentes, tensões políticas – há cada vez mais obstáculos para as comunidades indígenas que procuram proteger os seus recursos naturais. Em novembro de 2024, o coordenador executivo da APIB, Alberto Terena, disse à Agência Brasil que uma legislação como a PEC 48 “É uma ameaça contra as nossas terras demarcadas e as já demarcadas porque eles vão querer rever as já demarcadas com o marco temporal. A luta indígena envolve toda a sociedade brasileira por agravar a crise climática.”

EXTERNAL LINK

A ORGANIZAÇÃO PARCEIRA

O Coletivo Inamatí Xâné Terenoe surgiu em 2021, durante a pandemia de COVID-19. A formação da organização foi uma resposta à necessidade urgente de mais ações de preservação ambiental e cultural na comunidade Terena, especialmente ao nível de ações lideradas por jovens. Na origem do Coletivo está um grupo de jovens educadores, comunicadores e investigadores Terena, da Aldeia Bananal. A organização representa o compromisso de uma nova geração apostada em enfrentar desafios contemporâneos, ao mesmo tempo que honra os conhecimentos e práticas tradicionais.

A essência do Coletivo é ser uma ponte entre gerações, que une a sabedoria dos membros mais velhos da comunidade à energia e à capacidade de inovação dos mais jovens. O trabalho da organização toca em múltiplas dimensões da vida da comunidade, incluindo a proteção ambiental, a monitorização do território, a preservação cultural e a gestão sustentável dos recursos. Esta abordagem está profundamente enraizada nos valores tradicionais dos Terena, mas adopta também ferramentas e métodos contemporâneos, capazes de responder aos desafios do presente.

301635377_112493644915429_2702303741171607581_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A eficácia deste trabalho e desta abordagem têm sido evidentes desde as primeiras iniciativas comunitárias levadas a cabo pelo Coletivo. É de destacar o desenho e implementação de projectos ambientais, tais como a recuperação de lagos comunitários e a proteção de fontes de água. Mas o trabalho da organização vai muito além deste âmbito, abrangendo também áreas como a documentação e a comunicação, através das quais assegura a preservação do conhecimento tradicional e o registo detalhado das actuais condições ambientais, para uso das gerações futuras.

334295632_6040036742685530_3406140533662151257_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

O Coletivo responde às orientações dos líderes comunitários, assegurando que as actividades implementadas respeitam as estruturas de governação tradicionais. Ao mesmo tempo, o Coletivo está fortemente apostado na capacitação de jovens lideranças na comunidade. Esta abordagem permite construir uma relação de confiança genuína com a comunidade, e introduzir, simultaneamente, soluções inovadoras para os desafios ambientais urgentes que afectam os Terena.

314707617_135515779287872_3916886336189579725_n

Credit: Coletivo Inamatí Xâné Terenoe

O PROJECTO

A promoção da segurança hídrica está no centro deste projecto, que pretende, através de uma abordagem holística, enfrentar os desafios sentidos pela comunidade no acesso à água. Para tal, combina o recurso ao conhecimento tradicional Terena com práticas contemporâneas de gestão ambiental. No seu cerne está a filosofia dos anciãos Terena, que dizem ser possível “plantar água” – uma expressão que denota a profunda interligação entre saúde da floresta e segurança hídrica.

O projeto parte de um mapeamento hidrográfico abrangente do território. Abrangente, porque não só envolve levantamentos técnicos, como também uma documentação do conhecimento tradicional sobre as fontes de água e as suas alterações históricas. A equipa do projecto responsável pela cartografia está a trabalhar de forma muito próxima com os anciãos da comunidade, para que fiquem registados, a par dos dados físicos, os conhecimentos tradicionais sobre as fontes de água. Desta forma, o projecto está a criar um repositório único, que cruza e une conhecimento científico e tradicional.

325951532_1494513357746045_5927502803448459902_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A componente do projecto ligada à recolha de águas pluviais tem como objetivo proporcionar um alívio imediato das necessidades da comunidade. Mas, ao mesmo tempo, almeja uma resiliência a longo prazo. Os sistemas de recolha que estão a ser construídos respeitam a arquitetura tradicional, mas incorporam técnicas contemporâneas que melhoram significativamente a sua taxa de eficiência. Os membros da comunidade estão a receber formação para serem capazes de fazer a manutenção do sistema, permitindo autonomia na gestão da água recolhida, e assegurando a sustentabilidade das instalações.

Mas a filosofia Terena que afirma ser possível “plantar água” está especialmente presente na componente do projecto focada no reflorestamento através da plantação de espécies nativas. Para este trabalho, anciãos da comunidade colaboram com especialistas em botânica, tendo em vista a construção de um viveiro rico em espécies conhecidas pelas suas propriedades de retenção de água e pelo seu significado cultural. Esta iniciativa procura não só recuperar áreas degradadas, como também reforçar a ligação da comunidade aos seus conhecimentos tradicionais sobre o meio ambiente.

Todas as componentes do projeto enfatizam a participação da comunidade e a transferência inter-geracional de conhecimentos. A formação e a documentação estão presentes em todas as actividades, de forma a garantir que os conhecimentos e competências desenvolvidos continuarão a beneficiar a comunidade muito depois do período inicial do projeto.

334578576_569417101801778_3903016549135222750_n

Credit: Inamatí Xâne Terenoe Collective

A Azimuth World Foundation orgulha-se de ter apoiado este projecto do Coletivo Inamatí Xâné Terenoe. Convidamo-lo a saber mais sobre o trabalho vital da organização na proteção dos recursos hídricos e do património ambiental do Pantanal. Pode entrar em contato com o Coletivo através da página oficial no Facebook, caso queria saber como pode apoiar directamente as suas iniciativas:

A Azimuth World Foundation não faz angariação de fundos para si mesma, nem para os seus parceiros, e não recebe doações. O link partilhado acima reencaminha diretamente para o perfil oficial do Coletivo Inamatí Xâné Terenoe no Facebook.

Share